Sabores ricos e terrosos, polpa suave e macia – estas frutas celestes dão para mais do que apenas sopas. Clarissa Hyman conta-nos toda a verdade.
Quando se trata de tartes e sopas, ensopados e caril, o meu conselho é que se procurem sempre as variedades mais pequenas, que ofereçam as cores vivas de Van Gogh, uma textura densa, mas macia, e um sabor rico e terroso. Cabaças, morangas, chilas, abóboras.
Nomes e definições sobrepõem-se e são frequentemente intercambiáveis, mas todos pertencem à família Cucurbitaceae e ao género Cucurbita dentro dela. As principais espécies são Cucurbita pepo e Cucurbita maxima, mas, como The Oxford Companion to Food observa, “O género apresenta problemas intratáveis de nomenclatura”.
Não aprofunde muito a teoria, a menos que queira acabar com uma dor de cabeça tão grande quanto uma abóbora-menina. Existem centenas de variedades todas as formas, cores e tamanhos. Quando se trata de identificação, são tão numerosas que iria além do limite de qualquer livro de culinária tentar enumerar os méritos comparativos.

As abóboras são conhecidas pelo crescimento das suas trepadeiras, embora existam algumas variedades de vinhas curtas que se adequam a um pequeno jardim. São colhidas quando estão completamente maduras e depois deixadas ao sol para que a pele possa endurecer e secar; desde que a pele não esteja danificada, os frutos inteiros podem ser armazenados por vários meses em local fresco e sem congelamento.
As melhores variedades dependem do destino que queremos dar-lhes. Algumas das variedades excelentes, mais raras em Portugal, incluem a Crown Prince, versátil e de longa duração, as Sweet Dumplings, pequenas bolinhas doces que podem ser recheadas e assadas inteiras, as Baby Bear de tamanho médio, com um talo verde-escuro, excelente para tortas e bolos, e as Queensland Blue com uma pele fina e acinzentada e uma boa textura quando cozidas.
A Muscade de Provence, com pele verde-alaranjada e polpa húmida e delicada, é semelhante à menina, mas tem uma cor mais alaranjada. De acordo com o Eurostat, Portugal assume o quarto lugar de produtor europeu de abóboras, com 75.000 toneladas no ano passado, e a Espanha encabeça a lista.
As variedades menina, chila e porqueira, para além da curgete, são as mais consumidas no país. Como regra geral, quanto maior a abóbora, menos sabor a polpa terá. Ao comprá-las, procure frutas duras, pesadas e sem manchas. Não há nada como aproximarmo-nos graciosamente de uma abóbora gigan tesca.
Depois de dado o primeiro golpe e cortada a casca dura e com nervuras, como se cortássemos troncos em crescimento na selva, muitas possibilidades se abrem. As abóboras tendem a ser aquosas e a desintegrarem-se facilmente. Por isso, uma das melhores maneiras de as cozinhar é assar fatias grossas nas suas próprias cascas, regadas com azeite e ervas ou temperos: assim, a casca e as sementes desprendem-se facilmente da polpa.
Pedaços grandes assados combinam particularmente com caça – a época das duas é coincidente – e a polpa pode ser desfeita em puré. Alternativamente, podem refogar-se cubos com alho, pinhões e coentro fresco, ou colocá-los numa panela com apenas umas gotas de água, tapados e cozinhados em lume baixo até ficarem macios.
Dê-lhes um tratamento de luxo numa aveludada e dourada sopa de abóbora com um toque de gengibre e alho, ou junte-as com castanhas, bacon e sálvia para um caldo para os dias mais frios. Adicione-as a um estufado picante com feijão, cogumelos, batata-doce, milho e pimenta.
Faça ravióli com abóbora, sálvia e pecorino, ou dê um ar italiano medieval com a intrigante mas eficaz inclusão de biscoitos amaretti desfeitos. O risoto com abóbora e sálvia é outro clássico do norte da Itália, enquanto no Chipre, os pastéis são recheados com abóbora e trigo triturado, temperados com cravo, canela e passas.
Não podemos esquecer que a fruta desempenha um papel tradicional no Dia de Ação de Graças americano e que as tartes feitas com abóbora fresca, ovos, natas, açúcar mascavado e especiarias de gengibre são iguarias dos céus.
As sementes de abóbora, que contêm uma boa percentagem de óleo, são lavadas, secas e salgadas para a alimentação. Existem até mesmo variedades especiais criadas com sementes sem casca e que podem ser comidas inteiras. Acredite que é viciante.
O óleo de semente de abóbora cor de âmbar tem um sabor fabuloso a nozes e é melhor quando usado como condimento do que como óleo de cozinha. É uma especialidade da Áustria e da Eslovénia, onde os registos da sua produção remontam ao século XVII.
É feito pressionando-se as sementes de abóbora torradas e descascadas de uma variedade local, a abóbora da Estíria. Espalhe-o, por exemplo, sobre fatias de carne assada ou num risoto antes de servir, ou adicione algumas gotas no gelado de baunilha.
VOCÊ SABIA QUE…?
– Frutos a pesarem 100 kg eram comuns nos mercados da Londres do século XIX.
– Os nativos americanos eram conhecidos por usarem abóboras para fins medicinais, como tratamento de problemas renais
e cicatrização de feridas.
– Em português, abóbora vem do latim apopore, mas a palavra inglesa “pumpkin” deriva de “pepon”, a palavra grega para “melão grande”.
Artigo publicado na edição de janeiro/fevereiro 2019.
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